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sexta-feira, 31 de julho de 2009

DIA DE CACHORRO MORTO


DIA DE CACHORRO MORTO

Maria Raimunda Almeida Silva*

Hoje, pela manhã, quando me dirigia ao trabalho, deparei-me com duas situações extremamente similares: dois animais mortos, sendo velados por crianças.
O primeiro animal era um cachorro de médio porte, de cor preta com traços de um vira-lata comum. Estava jogado junto ao meio-fio, semicoberto por um pano branco que não dava para saber se era uma toalha ou resto de qualquer tecido. Ali, naquele momento, era uma mortalha. Estava teso, meio de lado: morto. Junto ao corpo, alguma coisa parecida com sangue o qual já estava sendo disputado por formigas e moscas. Indiferentes aos insetos, três crianças, na parte superior do meio-fio, olhavam, curiosas, para o defunto. O semblante delas demonstrava um pouco de seriedade. Olhavam. Só olhavam. Provavelmente não se demorariam ali, visto que estavam, certamente, a caminho da escola, já que estavam fardadas.
Um pouco mais à frente (talvez uns duzentos metros), quando dobrei uma curva, percebi algo branco, meio volumoso, estendido no meio da rua. Foi só o tempo de desviar o carro, um pouco para a esquerda, para não esmagar o animal, que já se encontrava morto. Nessa edição do féretro, as crianças (cinco) estavam no passeio da casa mais próxima, olhando para o animal sem nenhuma tristeza aparente. A impressão que dava era de que elas não estavam satisfeitas somente com a morte do animal: eles queriam muito mais: o esmagamento. Num relance, tive quase a sensação de que o animal havia sido colocado ali para o sacrifício, pois quando o carro despontou na curva, houve uma movimentação da turminha, quase expectativa. O desvio do alvo provocou frustração.
Dois momentos, quase simultâneos, igualados pela morte; diferenciados pelos vivos!

* Professora da EMARC de Valença